Há pouco tempo, escrevi
um texto no qual trabalhei o fato de que a religião começou a ser considerada
como um estigma no Brasil, ao menos na esfera pública e em ambientes
acadêmicos. Para desqualificar uma ideia basta dizer que aquele que a defende o
faz por motivos religiosos.
Quando escrevi o texto
já previa algumas críticas e elas vieram. Uma delas, que acho bastante
coerente, é que minha argumentação era um tanto quanto sensacionalista, afinal
a maioria absoluta dos brasileiros se declara cristã e não é possível que algo
a que adere a maior parte da população seja alvo de discriminação.
Respondi a essa crítica
dizendo que me referia a certas esferas e não ao todo do Brasil. Disse também
que as estatísticas não revelam tudo. De qualquer maneira, fiquei insatisfeito
com minha resposta e esta insatisfação me moveu a escrever este texto.
Para sustentar meu
ponto de vista, quero contar um caso que me ocorreu há pouco mais de um ano. Há
cerca de dois anos atrás nasceu o Pedro, filho de um casal de amigos muito
queridos. Eu e minha esposa tivemos a honra de sermos convidados para
padrinhos.
Como muitos sabem a
Igreja no Brasil exige que os padrinhos passem por uma pequena preparação antes
de assumirem um compromisso tão sério. Pois bem, vi a data que estava marcada a
preparação e percebi que não poderia comparecer porque, na época, dava aulas à noite. Informei-me sobre
as possibilidades e vi que em uma paróquia vizinha havia um horário compatível
com minha rotina de trabalho.
No dia da preparação
estávamos presentes eu e mais dois casais. Quem daria a palestra era uma freira
muito jovem e simpática. Ela começou falando sobre a importância da fé dos pais
e padrinhos e em certo ponto perguntou: qual é a frequência de vocês na missa?
Ouvindo as respostas fiquei surpreso. Todos disseram: uma vez por mês. Percebi
que as pessoas ali reunidas não tinham frequência nenhuma na Igreja, mas não
queriam dizer isso na frente da freira, por medo da reação. Vai que ela proíbe
o batizado! De qualquer maneira, a mentira foi meio mal contada. Se dissessem “de
vez quando” seria melhor...
Resolvi relatar essa
situação para dizer que a postura dos casais presentes naquela preparação
corresponde à da maior parte daqueles que de tempos em tempo se declaram
católicos nos censos ou em conversas sobre religião.
Este tipo de católico
não sofre nenhum tipo de veto. Não apenas porque é maioria, mas porque na
verdade, dele se pode dizer que não é nada. Não assume posições, não possui um
credo ao qual dá assentimento, não busca viver a partir de uma moral baseada no
Evangelho.
Não estou aqui para
dizer que o cristianismo em nada influenciou nossa nação, nem que nosso povo
não possui uma fé sincera. Longe disso! Quero dizer apenas que o catolicismo
acabou se tornando um dado cultural e não uma opção de vida. Uma matriz que
influiu em nossos costumes e festas, que gerou obras arquitetônicas e
artísticas que fazem parte de nosso patrimônio cultural, mas que, para grande
parte das pessoas não é o norte que guia suas vidas.
Convido os que me leem
a pensarem sobre como são as reações às exigências da Igreja Católica. Pensem
na missa dominical e na confissão. Pensem na participação ativa em pastorais e
movimentos... Pensem na moral sexual... Acredito que ao pensarem nisso,
gostando ou não do catolicismo, chegarão à conclusão de que os católicos, ao
menos os chamados praticantes, não são maioria...
Ser minoria é difícil,
reconheço. Mas convenhamos que os direitos dos grupos minoritários são cada vez
mais protegidos. O problema é ser parte de uma minoria que parece maioria. Quem
está nessa situação é visto como opressor, quando na realidade pode ser o
excluído. É visto como mainstream, quando na verdade é outsider.
Não quero assumir
nenhuma postura “vitimista”. Não estou dizendo “coitados de nós, somos tão
pouquinhos”. Não, nada disso. O cristianismo surgiu dentro do judaísmo, uma
minoria dentro do Império Romano. Nascemos como uma minoria dentro de uma
minoria. O problema não é esse...
O problema é vivermos
em um Estado democrático no qual a opinião de um grupo de cidadãos é
desqualificada em virtude de suas crenças. O problema é ouvir uma ministra
dizer que os valores religiosos não podem influenciar o estado mesmo que eles sejam
consensuais. O problema é que a maioria dos católicos é amorfa...
Escrevi este texto
apenas para dizer que os dados estatísticos não revelam nossa realidade e que
essa suposta maioria influencia muito pouco nos rumos de nosso país. Chego ao
fim dele querendo escrever outro, agora dirigido a esta minoria e refletindo
sobre os vícios de nosso catolicismo tupiniquim.
Encerro dizendo que acredito
ser a hora de assumirmos nossa identidade como a menor das maiorias. O
poder do cristianismo nunca esteve nos números, basta lembrar que doze bastaram
para começar tudo.
Alessandro Garcia
Sociologo - Coordenador da Oficina de Valores
4 comments:
maravilhoso!!!!!!!
parabéns, Alessandro... de novo, bateu na veia! entro no coro para q saia um texto para para esta minoria...! seria excelente tb.
Nem uma VÍRGULA a acrescentar. Perfeito - e preocupante!
Texto ótimo e necessário, Alessandro!!!
Algumas pessoas precisam despertar do sono da ignorância. Acredito que este texto não se limita só a "católicos de censo", mas até aqueles que estão na missa todos os dias e que são incapazes de levatar a voz contra uma injustiça que acontece ao lado. Lembremos que o beato também é uma deformação do cristão.
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