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Por: Alessandro



Habemus Papam! Nestes últimos dias,  pessoas de todo mundo, católicas ou não, arranharam no Latim. O conclave despertou o interesse de muitos, inclusive o meu. Esta é a segunda vez que acompanho a escolha de um Papa e, confesso, a experiência destes dias foi bastante distinta da que fiz em 2005.

Quando o Cardeal Joseph Ratzinger foi escolhido  sucessor de Pedro, lembro que vibrei muito, afinal já conhecia um pouco do homem e da obra. Já havia lido textos e documentos escritos por ele e a admiração que sinto por este grande intelectual criava suas primeiras raízes. Desta vez não foi assim. Quando o Cardeal Jorge Mario Bergoglio foi anunciado como novo Papa, logo pensei: quem é ele?

Gastei algumas horas do meu tempo entre ontem e hoje lendo sobre esse homem que hoje traz sobre os ombros essa grande responsabilidade. Resolvi então partilhar algumas de minhas impressões com vocês. De antemão digo: Não são palavras de um especialista, mas de um interessado. Lembro também que muito do que disser talvez já seja de conhecimento dos leitores.

Jorge Mario Bergoglio nasceu em 1936, seu pai trabalhava em uma empresa ferroviária e jogou basquete no San Lorenzo, clube pelo qual o atual Papa torce. O futuro cardeal fez um curso técnico de química, depois entrou para a Companhia de Jesus, onde estudou filosofia e teologia. É interessante saber que deu aulas de psicologia e literatura, além de ter sido reitor de um colégio, superior de uma província jesuíta  e arcebispo de Buenos Aires.

Há alguns detalhes de sua vida que foram bastante comentados nestes dias, mas merecem ser citados. Nosso atual Papa, quando cardeal de Buenos Aires, dispensou o motorista e se mudou para uma casa mais simples. Fazia uso de transporte público e possuía um fusca. Ele ama literatura e tem Jorge Luiz Borges e Dostoievski como  seus escritores preferidos. Além disso,  acorda todos os dias às quatro da manhã e fica em meditação até as sete. Não gostava que lhe chamassem cardeal...queria que se dirigissem a ele simplesmente como padre.

O atual papa, mesmo quando cardeal,  por diversas vezes escolheu cuidar de sacerdotes idosos e passou várias noites cuidando de doentes. Sempre foi de dispensar as  honrarias...Não é de se espantar que, mesmo após ser eleito Papa,  tenha aberto mão do carro que o levaria após sua aparição em  público e ido de ônibus com os demais cardeais.

Parece que o atual Papa já começou seu pontificado tendo como marca o ineditismo. Primeiro Papa do Novo Mundo, primeiro jesuíta, primeiro Francisco, primeiro Papa a ter a oportunidade de bater um papo amigável, logo após sua eleição,  com aquele que o antecedeu.
Admito que o nome Francisco foi uma surpresa também. Não porque nunca tivesse imaginado uma Papa chamado assim, mas porque é uma escolha de muita coragem. Francisco de Assis, embora muito mal compreendido, talvez seja o santo católico com maior apelo. Sinônimo de pobreza, desprendimento, obediência e amor a Deus e a todas as criaturas. Seus maiores admiradores chegam a dizer que ele é o Santo que mais se aproximou do Mestre.

Embora o nome tenha sido escolhido em referência ao “pobre de Assis”, não é possível deixar de pensar que outro grande nome ressoa nessa escolha: São Francisco Xavier. Este jesuíta foi um dos maiores missionários de todos os tempos. Foi da Europa à Índia, da Índia ao Japão...Morreu sonhando em levar sua mensagem à China. Algo interessante sobre este outro grande Francisco é que ele buscava entrar na cultura a que se dirigia. Aprendeu japonês e, quando no Japão,  cumprimentava os mais velhos curvando-se profundamente...Buscar seguir o exemplo de Francisco Xavier significa fazer-se próximo aqueles que podem estar distantes e ser capaz de diferenciar o essencial do relativo para assim atingir os corações de todos.

Hoje pela manhã li a declaração de um Bispo que dizia que Jorge Mario Bergoglio é um jesuíta com coração franciscano. Pensei então que a escolha do nome revela uma opção pela unidade cuja percepção, para muitos,  pode escapar. Embora Francisco de Assis seja o grande exemplo de Inácio de Loyola, fundador do jesuítas, é fato notório que em alguns momentos da história houve alguns desentendimentos entre as ordens. Sendo assim, um jesuíta escolher chamar-se Franscisco, ao mesmo tempo que revela uma grande fidelidade ao exemplo do fundador da Companhia de Jesus, mostra que o Papa ama uma Igreja que manifesta-se de diversas maneiras e em diversos rostos.

O Papa Emérito Bento XVI é um  homem vindo da universidade. Julgo que três palavras  descrevem sua vida de serviço: teólogo, professor e pregador. Diante de suas palavras, sua presença passava quase despercebida. Não é a toa que dizem que muitos iam a Roma para ver João Paulo II, e, depois de sua morte,  passaram a ir a tal cidade para ouvir Bento XVI. A visita a Roma agora terá uma diferente motivação, afinal, com sua primeira aparição,  fica claro que o Papa Francisco é alguém cuja maior eloquência está nos gestos.

Sei que já há alguma polêmica sendo gerada em torno do Papa. Dizem que ele apoiou a ditadura argentina e que ajudou a esconder bebês de suas mães. Aprendi a ter uma dúvida sadia de tais críticas. No caso de Bento XVI,  afirmaram que ele era nazista, apesar de qualquer um que conheça minimante sua biografia saber que ele cresceu em um lar no qual tal regime era visto como uma espécie de manifestação do anticristo. Ah...outro ponto que me faz ficar com a pulga atrás da orelha em relação a tais acusações vem do fato de  que elas começaram a ter um vulto maior quando o Cardeal Bergoglio começou a tecer críticas ao governo Kirchner. Vale ressaltar que Horácio Verbitsky, autor do livro “El Silêncio”, no qual as acusações são feitas, possui relações com o atual governo argentino.  Será mera coincidência?

Acerca dessa polêmica, cabe ainda dizer que  Nobel Adolfo Pérez Esquivel, ganhador do prêmio do Nobel da paz e grande militante argentino pelos direitos humanos, afirmou que o Cardeal Bergoglio não possuiu laços com a ditadura e que muitos bispos argentinos intercederam a favor de presos políticos e não foram atendidos. A posição de Esquivel ganha mais força quando se sabe que ele não poupa a Igreja argentina de críticas acerca de tal período, críticas que a própria Igreja aceita ao reconhecer que muitos de seus membros erraram e que muito mais podia ter sido feito para ajudar as vítimas.

Vou ficando por aqui...Ao escrever este texto corro o sério risco de não parar. Isso acontece sempre que tentamos escrever sobre pessoas ou assuntos que acabamos de conhecer. O fato de termos pouca familiaridade faz com que prestemos atenção em tudo...Cabe, antes de encerrar,  dizer que o Papa Franscisco nos traz esperança. Esperança não de uma ruptura com o passado, mas de uma continuidade renovadora. A Igreja é grande porque não joga fora as diferenças, mas as abraça e faz com que a riqueza da diversidade resplandeça. Resumindo: Ontem Bento XVI, hoje Francisco...sempre Pedro.

Ah...já ia esquecendo! O Papa é argentino. Um hermano... Um grande e bom hermano. Apesar de toda a empolgação e esperança, faço questão de dizer que Deus continua sendo brasileiro!

Alessandro Garcia
Doutorando em Sociologia - Fundador da Oficina de Valores  

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