Por: Alessandro
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imagem de: euacheiprimeiro.com |
Quero partilhar
com o leitor uma atitude que infelizmente vivenciei, anos atrás, em um
aniversário. Admito que tenho vergonha do ocorrido, mas acredito que valha a
pena tornar pública essa minha pequena infantilidade. Friso que não desejo
apenas narrar uma anedota, mas expor algumas ideias que tenho tentado viver de
uns tempos para cá.
Sempre fui uma pessoa com dificuldade de criar
laços, mas
acabei ganhando alguns amigos com o decorrer do tempo. Além disso,
como estive ligado a atividades pastorais criei uma rede razoavelmente extensa
de pessoas pelas quais tenho afeto. Pois bem, há alguns anos em um dia três de
julho fiquei em casa. Confesso que, como era meu aniversário e eu conhecia
muita gente, esperava diversos telefonemas de felicitação. Acontece que,
naquele dia, só duas pessoas me ligaram. Era o início do uso das redes sociais
e recebi diversos scraps no Orkut, mas ouvi a voz de poucas pessoas. Fiquei
triste, revoltado e com raiva daqueles que deixaram “meu dia” passar em branco.
A experiência
desse dia não foi agradável, afinal nunca é fácil esbarrarmos em nossas
imaturidades. Fiquei emburrado um tempo, mas com o passar dos dias pude pensar
melhor e chegar a algumas conclusões importantes. A primeira, e mais óbvia, é
que eu não podia reclamar que não
tivessem telefonado no dia do meu aniversário. Sou uma das pessoas mais distraídas
que conheço e raramente lembro as datas de aniversários. Se alguém deve ser
compreensivo com esse tipo de esquecimento esse alguém sou eu.
A segunda grande
reflexão é que embora seja ótimo ver os outros se alegrando por meu
aniversário, isso vale pouco quando eu mesmo não me alegro por ter nascido. Vou
tentar me explicar melhor. O fato é que todos nós ao nascermos, recebemos o
mundo de presente e somos um presente ao mundo.
É bom sabermos que outros são felizes porque existimos. Apesar disso,
nenhuma pessoa dará ao mundo mais do que recebeu dele. Por maiores que sejam as
obras de alguém, este alguém recebeu muito mais pelo simples fato de ter
nascido. Colocando em poucas palavras: claro que é bom nos sentirmos queridos.
Melhor ainda é sermos gratos.
Quando li “O
Senhor dos Anéis”, uma das coisas que mais me marcou foi o fato de que os
Hobbits, não recebem presentes em seu aniversário, mas dão presentes. Parei
para pensar e vi que a atitude tem bastante sentido. Tolkien criou personagens que estavam felizes
por existir e celebravam tal felicidade tentando de alguma maneira retribuir um
pouco o tanto que receberam.
Ainda não
comecei a distribuir presentes no dia de meu aniversário. Tenho me esforçado,
no entanto, para vivenciar mais a gratidão. Gratidão a minha família, a meus
amigos, a Deus. Tenho tentado tornar meu aniversário um dia de agradecimento.
Agradecimento por tudo e por todos. Sei que minhas palavras podem soar
ingênuas, mas não importa. Tenho motivos mais do que suficientes para me
alegrar por ter vindo a esse mundo. Eis alguns deles:
Há trinta e um
anos ocorreu um evento que passou despercebido para os historiadores,
jornalistas e público em geral, mas que fez toda a diferença para mim: eu
nasci. Desconheço os detalhes, mas sei que pouco mais de um ano antes um casal
de namorados foi até diante de um altar e lá se casaram. Desta união eu surgi
como fruto.
Diversas
variáveis confluíram para que meu nascimento fosse possível. Sei que pequenos
detalhes poderiam ter alterado tudo. Meus pais poderiam ter escolhido adiar o
nascimento do primeiro filho, por exemplo. Além disso, outras pessoas poderiam
ter surgido do amor de meus pais, talvez pessoas muito melhores. Não vou negar
que fico muito feliz que aquele que nasceu fui eu.
Nasci. Chorei.
Ri. Aprendi a falar. Brinquei bastante. Fui para a escola e aprendi a ler.
Levei palmadas de minha mãe. Recebi carinho também. Fiz bagunça, embora não
muita. Cresci um pouco. Virei adolescente. Aprendi a jogar xadrez. Colecionei revistas em quadrinhos. Joguei RPG.
Tornei-me católico. Fiz amigos. Namorei.
Li bons livros e alguns não tão bons. O mesmo vale para os filmes. Estudei ciências sociais. Dei aulas e
palestras. Casei. Viajei. Contei piadas e ri de piadas contadas por outros.
Errei em algumas coisas na vida. Acertei em outras.
Uma vez por ano,
festejo todos os verbos acima. Celebrar um aniversário significa lembrar-se do
dia em que tudo começou. Sei que pode parecer piegas, mas ter nascido é o
melhor presente que alguém já ganhou, afinal foi este que tornou todos os
outros presentes possíveis. No meu lugar poderia não haver coisa ou pessoa
alguma e, no entanto, cá estou eu, tendo a possibilidade de vivenciar alegrias
e dramas.
Bom...não sou um
materialista, por isso creio que a vida, além de um presente, é uma espécie de chamado. Fomos convidados a
esse mundo, que infelizmente anda bem bagunçado. Somos colocados aqui com a
missão de ordenar melhor a realidade à nossa volta, de contribuir para que as
coisas sejam melhores. Claro que a contribuição de cada um será diferente, e é aí que está a graça. Em
última instância todos nós somos insubstituíveis. Uns são dados à poesia,
outros à matemática. Alguns são práticos, outros nem tanto. O fato é que cada
um reflete de forma única em sua humanidade aspectos daquele que é divino.
Celebrar meu
aniversário me faz olhar para mim e pensar: o que foi colocado em minhas mãos?
O que posso fazer? A que sou chamado?
Sei que provavelmente não será algo chamativo ou grandioso, mas tenho certeza
que é algo essencial. A mim, como a cada um, foi confiado algo que não pode ser
delegado. Que talvez possa ser executado por outro, mas que se se assim for
nunca terá a cor que só eu posso colocar.
É bom celebrar
meu aniversário. É bom ter vindo a esse mundo. É bom saber que me foi confiada
uma missão. É maravilhoso saber que há
pouco mais de trinta e um anos atrás Deus olhou para esse mundo e julgou que
faltava algo. Para completar a sua obra prima, Ele criou o Alessandro. E, é
claro, isso não vale apenas para mim, mas para todas as Carolinas, Josés, Rodrigos, Andersons, Sirlenes,
Anas; Vale também para você que agora lê
esse texto.
Talvez eu e você não tenhamos nada em comum,
mas com certeza compartilhamos o fato de que Alguém julgou que valia a pena nos
colocar aqui. Julgou que nossa presença iria tornar a realidade mais rica e o
mundo mais alegre, ou mais sábio, ou mais justo, ou mais paciente, ou mais
divertido, ou mais prudente...Enfim, julgou que havia algo que só eu e você
poderíamos dar a esse mundo. E por julgar esse algo tão importante e valioso,
resolveu dar esse mundo a nós.
Alessandro Garcia
Doutorando em Sociologia / Fundador da Oficina de Valores
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