Por: Fernanda
imagem de: fanfiction.com.br |
Comecei a ler os livros do Harry
Potter em 2000, quando eles começaram a ficar mais populares no Brasil. Embora
eu já tivesse gosto por livros, foi a primeira vez que abri um livro de mais de
200 páginas. E depois que abri... Foi amor à primeira vista.
Minha paixão começou quando tinha
apenas nove anos, era nova o suficiente para me envolver na história com muita
intensidade e até esperar por alguns meses a carta de Hogwarts que nunca
chegou. (Aliás, se tivesse chegado, não poderia estar contando aqui...).
Os personagens que eu amava, eu
amava. E os que não me agradavam também despertavam sentimentos intensos. E
esse foi o caso daquele professor de poções, diretor da casa Sonserina. Por
sete anos, com seus cabelos oleosos e sua voz arrastada, Severo Snape
atormentou os três personagens principais da saga, chegando até por vezes (como
no livro um e depois no livro seis) nos fazer achar momentaneamente que o
inimigo a ser combatido, na verdade, era ele.
No entanto, ao longo dos sete livros,
a verdadeira identidade de Snape vai sendo revelada e a gente vai começando a
entender que sua postura agressiva é justificada por toda a rejeição, toda
incompreensão e toda frustração que ele encontrou na sua adolescência. E a
parte mais legal é que nós vamos descobrindo que por trás de suas atitudes
repulsivas, Snape estava sempre ocupado em fazer a coisa certa e lutar pelo
bem.
A primeira coisa que podemos refletir
sobre sua vida é o fato de que as pessoas não viam quem ele realmente era. Nos
últimos livros, Snape foi taxado de vilão, enquanto seu objetivo era
simplesmente assegurar que tudo correria bem, sem que nem mesmo Harry Potter
soubesse. Eu particularmente já vivi uma experiência de Snape e imagino que
mais alguns aqui também tenham se identificado. Uma situação em que não importe
o quanto eu me esforce, meus defeitos sempre serão mais proeminentes do que
meus acertos e quando os outros me olham, isso é tudo que eles enxergam. E aí?
Como a gente reage a isso? Snape conseguiu, por muito tempo, pois dentro de si
ele tinha uma certeza: ele estava fazendo a coisa certa, e isso importava mais
do que a opinião alheia.
O segundo ponto importante da
história de Severo Snape: as suas boas ações estavam ocultas. Arriscou sua pele,
fez coisas que não gostaria de fazer, manteve-se fiel a suas promessas e, no
final das contas, ainda era visto como vilão. As coisas boas que nós fazemos,
se as fazemos com retidão de intenção, não precisam ser divulgadas. Se eu faço
algum bem esperando recompensa, visibilidade, aplausos, eu estou na verdade me
guiando pela vaidade, e não pela consciência. Quando nós estamos fazendo a
coisa certa, com sinceridade, nós encontramos paz, sem nem precisar contar para
alguém ou colocar no Facebook. E como vale a pena experimentar essa paz...
O último ponto, é que conhecer a
história de Snape também pode ser para nós um motivo para julgar menos as
pessoas. Penso que esse pode ser o legado mais importante que a história desse
homem infeliz pode nos deixar. Ele tratava Harry com extrema hostilidade e
desprezo e depois descobrimos que ele só fazia isso porque enxergava em Harry
Potter seu pai, Tiago Potter, que durante seus anos na escola o havia tratado
com crueldade. A partir desse momento, Harry passa a enxergar Snape de forma
mais compassiva.
Diferente de Harry nessa situação,
nós não teremos a possibilidade de entrar nos pensamentos das pessoas para
saber exatamente o que elas passam ou passaram e porque têm uma personalidade
difícil, falta de paciência, insegurança... Nós podemos apenas ter em mente que
cada pessoa carrega sua história, sua caminhada e que julgar alguém sem
conhecer sua vida é sempre uma injustiça.
Ninguém gosta de ser julgado, de ser
taxado, de ser “interpretado”. Mesmo quando temos defeitos muito grandes, no
fundo sempre esperamos que as pessoas nos olhem com otimismo e nos aceitar. E
como nós podemos combater isso? Lutar contra os defeitos nós devemos sempre,
mas quanto à aceitação das pessoas, nada. Exatamente, nada. A única coisa que
podemos fazer é quebrar a corrente e adotar uma postura diferente na nossa
forma de tratar as pessoas.
Quando lidamos com as pessoas
esperando coisas boas delas, sem perceber passamos a tratá-las melhor e a criar
um ciclo virtuoso de gentileza. E por mais que não nos pareça natural julgar
que uma pessoa aparentemente difícil seja uma pessoa boa, estamos na realidade
nos aproximando mais da verdade. Afinal, assim como eu, ela tem suas luzes e
suas trevas, seus problemas, seus medos, mas acima de qualquer coisa, ela está
buscando ser feliz.
Fernanda Gonzalez
Mestranda em Engenharia Urbana / Oficina de Valores
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