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Caricatura
Lembro que uma das primeiras vezes em que ouvi uma definição “culta” de algo banal e óbvio
foi a seguinte explicação de caricatura: “desenho que exagera características marcantes da
aparência de uma pessoa, identificando-a pelas tais e dando comicidade a sua imagem”. Ou
algo assim. Faz parecer inteligentíssimo quem diz uma coisa dessas, mas no fundo essa frase
quer dizer que se algo chama a atenção na aparência de alguém, o desenhista vai aumentar
aquilo para ficar engraçado. É uma imagem irreal, mas que só de olhar você sabe quem é e,
normalmente, ... Ri.
Bom, sobre caricatura mesmo eu não entendo muito, não saberia o que dizer (e nem acho que
seria muito útil ao meu caro leitor). Só quis começar por aí para falar sobre um assunto que vai
parecer não ter absolutamente nada a ver com caricatura: fanatismo religioso. E o leitor mais
perspicaz talvez já tenha percebido o raciocínio que farei, dada a definição do primeiro
parágrafo.
O fanatismo religioso está para a verdadeira religião como a caricatura está para a imagem real
de alguém: é um exagero de certas características que acaba em ridicularização. Mas há duas
falhas na analogia, diferenças cruciais e sobre elas vou tentar fazer ver o leitor (religioso ou
não) a gravidade do engano que é olhar de lupa apenas certos aspectos da religião.
Antes de refletir sobre estas diferenças é preciso entender o que quero dizer com “fanatismo”. A primeira ideia que
talvez venha a mente seja a do testemunha de jeová que bate na sua porta domingo de manhã
ou da velhinha que passa mais tempo na sacristia da igreja do que parece humanamente
possível. Não é bem por aí. Por fanatismo entendamos toda forma de exagero no
comportamento: aquela pessoa que fala muito ou só, que tem um senso estético
ridiculamente recatado ou bizarro, aquela pessoa que, não sabendo dosar, falta com outros
aspectos da vida (família, estudos, trabalho, e até lazer) por “obrigações” religiosas.
A primeira das diferenças é óbvia: enquanto uma literal caricatura é uma imagem, apreensível
à visão e portanto concreta, o fanatismo é uma caricatura abstrata, compreensível apenas sob
reflexão, não é óbvia ou facilmente identificável. O que quero dizer é que, ao olhar para uma
caricatura de uma celebridade, você sabe que ali não está a verdadeira imagem daquela
pessoa, mas uma distorção clara e proposital. Já o fanatismo, nem sempre se sabe que é
fanatismo, pode-se pensar que aquele exagero religioso que se pratica ou que se vê nos outros
representa a realidade da crença. Ao contrário da caricatura, o exagero pode não parecer
exagero, especialmente pra quem pratica. É possível que você conviva com alguém
extremamente exagerado na exposição daquilo que acredita e isso te tenha “traumatizado”,
ou melhor, criado barreiras em relação a religião (ou outra crença, vide universitários
marxistas militantes). Por um indivíduo, toda uma doutrina e\ou espiritualidade são taxadas
erroneamente. Então, se você convive com alguém assim, tenha paciência e procure corrigir
(sem ofender!). Aquele papo, do “todo crente é chato”, vou te dizer, não é bem assim! E, se
refletindo, você chegar à conclusão de que comete exageros na prática da sua fé, repense. “Religião é tudo”? Vou te dizer,
não é bem assim!
Pensando por aí, somos levados a segunda diferença: enquanto a caricatura é propositalmente
produzida por alguém que queria brincar (com ou sem maldade) com a imagem de alguém, o
fanatismo é uma “autocaricatura”, ou seja, são pessoas religiosas mesmas que distorcem a imagem da sua religião. É lógico que isso não é proposital, é mais aquela coisa da pessoa
empolgada que acaba passando dos limites, sabe? Quando falta entendimento da própria
crenças e sobra vontade de vivê-la intensamente, está feito o desastre. Conhecendo um lado e
ignorando outros, é provável que uma pessoa religiosa “funde” nos seus conceitos uma
religião inexistente e convença as pessoas, além de si mesma, de que aquilo é a verdade sobre
a religião a que pertence.
Ou isso (a ignorância), ou o egoísmo manifestado num exagero daquilo que é mais agradável
pessoalmente. Por exemplo: como católico, conheci pessoas que tinham tanto gosto pela
oração que tinham os olhos fechados a outras realidades e diante de uma situação adversa
punham-se de joelhos esperando que Deus fizesse milagrosamente o que elas podiam fazer
com as próprias mãos (e talvez fosse isso mesmo que Deus esperava delas). Mas isso é mais
uma explicita alfinetada em pessoas de fé (qualquer fé).
Voltando ao verdadeiro objetivo do texto, que é fazer ver que a ideia de religião, de modo
geral ou de alguma específica, seja você religioso ou não, pode ser uma mera caricatura, uma
distorção ridícula da verdadeira essência e forma de algo que é imensamente maior do que
uma caricatura seria capaz de transmitir. Pense que, mesmo ignorando ou desacreditando o
aspecto sobrenatural de todas elas, olhando apenas sob uma perspectiva humana, as religiões
arrebatam bilhões de pessoas no mundo todo e isso tem que significar que há algo mais do
que a ideia tosca que a convivência com um “fanático” te tenha dado. Procurando conhecer,
pode ser que você se encante ou que aumente sua aversão. Como alguém que passou mais
tempo pagão que religioso e fez o caminho da aversão ao encanto, posso apostar na primeira
opção.
Gustavo Cardoso Lima
Estudante de Jornalismo / Oficina de Valores
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