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O Decepcionante Jesus Cristo
Alguns dizem que Ele era de
esquerda. Outros, que era de direita. Alguns O enxergam como revolucionário. Há
também aqueles que afirmam que Ele não estava interessado em política, mas apenas na
salvação das almas. Não é incomum que os pacifistas mencionem a vez em que Ele
disse que devíamos oferecer a outra face. A estes se opõem os que fazem questão
de lembrar sua fala que relaciona o céu com os violentos e a vez em que
expulsou a chicotadas alguns camelôs que faziam algazarra no Templo de
Jerusalém.
É impossível não recordar também
a discussão entre tradicionalistas e progressistas. Se uns fazem questão de
salientar o quanto o mundo moderno se afasta dele, os outros, mais modernos,
bradam que quem está afastado, tanto dele quanto do mundo, são os
tradicionalistas.
Chega a ser assombroso como os
mais diversos partidos conseguem enxergar sua bandeira como contida na vida ou
na doutrina do galileu que há dois mil anos foi crucificado. Vegetarianos,
amantes dos animais, ambientalistas, socialistas, capitalistas, conservadores,
modernizadores, espiritualistas, materialistas, jogadores de futebol e
comentaristas de TV… Todo mundo, ou quase todo mundo, enxerga em Jesus Cristo
um correligionário. O maior deles, talvez! Aquele que melhor encarnou a bandeira
que hoje é por eles defendida. Aquele que fez isso 2000 anos antes de qualquer
um!
Sendo sincero, quando alguém diz que
seus adversários agem de maneira diferente da de Jesus, creio que fala uma
grande verdade. Só não expressa a verdade completa porque normalmente não se
inclui no bando daqueles que são diferentes do nazareno. Não inclui a própria
ideologia no bojo daquelas que seriam criticadas por Ele. Não se inclui entre
aqueles que ficariam muito incomodados com sua mensagem.
Tenho uma teoria que provavelmente
não vai agradar a muitos: julgo Jesus Cristo a maior decepção da história
humana. Decepcionou os que viveram em seu tempo e decepcionaria a todos nós
caso convivesse conosco. Eu assumo que a mim, Ele decepciona.
Decepcionaria direita e esquerda
ao dizer que seu Reino não pertence a esse mundo. Aos primeiros, decepcionaria
porque provavelmente não se importaria que os menos favorecidos fossem
“privilegiados” nas políticas públicas. Aos que estão no lado oposto do
espectro político decepcionaria por defender uma moral mais tradicional do que
aquela que julgam que Ele defendia e por não julgar que todas as religiões
sejam iguais.
Aos tradicionalistas ele
decepcionaria por causa de suas releituras inusitadas das tradições judaicas e por dizer que muitos costumes arraigados negam princípios maiores que aqueles
que julgam defender. Deixaria chateados os progressistas pelo fato de dizer
que não veio abolir o que antes foi dito, mas dar pleno cumprimento.
Se a lista continuasse, não seria
difícil elencar motivos e mais motivos para grandes decepções. Quem coloca
Jesus em um partido ideológico, só o faz quando mutila a figura que afirma
admirar. Se as fontes tradicionais forem consultadas com mais afinco, e a
profundidade de suas paradoxais declarações forem realmente ponderadas, ficará fácil deduzir que muitos dos que O elogiam, seriam os primeiros a
expulsá-Lo de seu círculo de amizades ou de sua roda de interesses.
Boa parte dos que gostam de Jesus
não gostam de alguém que conheceram ou ao menos estudaram, mas de alguém que
fabricaram. No fundo, admiram uma figura que julgam confirmar suas opiniões.
Uma figura que sacraliza suas posições.
Não há como aproximar-se dele sem
decepcionar-se com Ele. Talvez este seja um dos fatos mais incontestáveis sobre
Jesus de Nazaré.
Quem não se decepcionou com Ele, não
se deixou questionar por Ele. Colocá-lo nas caixinhas ideológicas que
temos à disposição é a maneira mais fácil de fingir que conhecemos alguém de
quem mal sabemos o nome. E isso vale tanto para ateus quanto para cristãos. Não
é difícil encontrar aqueles que O criticam por algo que Ele não disse ou fez.
Também não é incomum encontrar, entre os que acreditam, aqueles que creem em
alguém que não existiu, mas que é uma mera paródia, ou uma caricatura, daquele
em quem dizem crer.
Não pretendo incorrer no erro que
denuncio e dizer que O entendo plenamente. Que onde todos erram, eu
acerto. Não… Também eu sou um decepcionado. Se não o fosse, isso significaria
que fiz com que Ele coubesse na minha medida, que sua mensagem fosse
circunscrita às minhas certezas.
Sou um decepcionado com Cristo.
Dia após dia, ano após ano, tenho acumulado decepções. Acho estranho, no
entanto, como essas decepções têm a estranha capacidade de me alimentar, de
fazer com que eu saia dos meus esquemas e descubra horizontes maiores. Claro
que isso não é fácil… Vez por outra fico satisfeito com Ele. Reconheço que
nesses momentos faço uma grande inversão psicológica e considero que eu seja o
mestre e Ele o seguidor.
Não há verdadeiro cristianismo
sem decepção, sem escândalo. Olhando com certa atenção os ditos e feitos de
Jesus é impossível não perceber que Ele nunca dá respostas prontas que se
encaixam perfeitamente nas concepções daqueles que Lhe dirigem suas perguntas.
Ao responder, sempre provoca. Revela grandes respostas e novas e importantes
perguntas.
Aproximar-se de uma figura que é
tão incompreendida, embora seja decepcionante, é deveras fascinante. Essa
aproximação, no entanto, só rende quando há a coragem do deixar-se interpelar,
do não querer dizer o que Ele pensa sem ter prestado atenção no que Ele tem a
dizer.
Ao fim desse texto, talvez
alguns estejam pensando: “É isso que fulano precisa ouvir/ler. Ele não
entendeu nada.” Confesso que o próprio autor pensou algo do tipo
antes de chegar a essas últimas linhas… Nessas horas, cabe lembrar
que a crítica ao outro, mesmo quando verdadeira, é, muitas vezes, a
melhor defesa contra a autocrítica. E que muitos dos que dizem conhecê-Lo, na
verdade nunca O encontraram.
Alessandro Garcia
Doutorando em Sociologia - UFRJ / Fundador da Oficina de Valores
2 comments:
Muito rica sua reflexão. Obrigado!
Excelente texto! Parabéns pela profunda reflexão. Deus abençoe sua missão!
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