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Homem-Formiga – Resenha
Existencial
Esta resenha está um tanto quanto
atrasada, mas melhor tarde do que nunca.
Dia 16/07 estreou nos cinemas
nacionais o mais recente filme da Marvel:
Homem-Formiga! A exclamação
talvez seja exagerada, afinal este é, com toda certeza, o filme menos esperado do
estúdio nos últimos anos. Mesmo nos
quadrinhos, o Homem-Formiga é um herói de segunda linha e nunca teve uma grande
popularidade. E o herói adaptado para
telas não é nem aquele que foi membro fundador dos Vingadores, mas Scott Lang,
alguém que “herdou” os nomes e poderes de Hank Pym, este sim o “Ant-Man” original.
Convenhamos que, para a maior
parte das pessoas, as aventuras de um herói que encolhe e “fala” com formigas
não são lá tão atrativas. Sendo assim, por que a Marvel fez um filme desse
personagem?
Como dizia um famoso programa
infantil: “Senta que lá vem história.”
Em linhas gerais, o motivo que
levou o Marvel Studios a realizar um filme do Homem-Formiga foi o mesmo que o levou
a fazer um filme do Homem de Ferro, que embora mais famoso que seu amigo que
diminui, nunca foi lá dos personagens mais populares da Marvel Comics.
A maior parte dos que hoje curtem
as aventuras dos Vingadores nos cinemas não sabe, mas a atual situação é fruto
de uma grande crise sofrida pela Marvel em 1996. A empresa entrou em falência e
acumulou uma dívida de 600 milhões de dólares. Como parte da estratégia para
resolver a situação, os direitos cinematográficos dos personagens mais
populares da editora foram vendidos para diversas companhias. O Homem-Aranha
e Motoqueiro Fantasma foram para a Sony; X-men e Quarteto Fantástico ficaram com a
Fox.
O primeiro filme dos X-men foi um
grande sucesso, o primeiro do Homem-Aranha um sucesso maior ainda. A Marvel, já
com seus problemas financeiros (e criativos!) sanados resolveu entrar na onda
das adaptações para o cinema. O problema é que o filet mignon estava com outros
estúdios. Solução: trabalhar com os heróis cujos direitos ainda lhe pertenciam.
A escolha recaiu sobre o Homem de Ferro. Bom... o resultado creio que seja
conhecido por todos.
A partir desse primeiro filme foi
traçada uma estratégia que traduziu para o cinema um elemento fundamental dos
quadrinhos: “continuidade”. Cada filme
seria “inteiro” e ao mesmo tempo funcionaria como um componente para um cenário
maior que conectaria todas as produções. Elementos lançados em um
longa-metragem poderiam ser aproveitados em outro e as “cenas pós-créditos”
fariam as conexões e instigariam os fãs para o que ainda estava por vir.
Chega a dar certa perplexidade saber que
algumas das franquias cinematográficas mais significativas da atualidade,
provavelmente, só foram lançadas porque os heróis mais famosos da editora
estavam nas mãos de outras empresas. Daquela que foi a situação
mais difícil da empresa surgiram as condições para seus maiores sucessos.
Dito isso, vamos ao filme do
Homem-Formiga. Mais uma vez, a Marvel tirou do seu baú um personagem menor e
mais uma vez conseguiu um sucesso significativo. Só nos EUA, o filme já
arrecadou 132 milhões de dólares; se formos contar o restante do mundo, a
bilheteria já ultrapassou os 300 milhões. Quando comparados com outros grandes
filmes do estúdio, como os “Vingadores”, esses números podem ser considerados
médios, mas temos que reconhecer que são bem grandes para o diminuto herói.
Deixando de lado o sucesso
comercial, vamos ao filme em si. Ele é
bom?
Mais ou menos.
A Marvel não tende a fazer bons
filmes de origem. O estúdio melhora muito nas continuações. Talvez a única
grande exceção seja com a franquia do Homem de Ferro. No caso de Homem-Formiga,
podemos dizer que este filme é melhor que o primeiro Thor, talvez que o
primeiro Capitão América, mas infelizmente é lotado de clichês e eles não são bem
trabalhados. Em vários momentos parece que estamos assistindo um daqueles “filmes
anônimos” que passavam na sessão da tarde. Sabe aqueles que quando se viu um,
se viu todos? Não acredita? Vou dar uma resumida na história:
Um homem bom comete um crime por
bons motivos. Vai para a cadeia. Sua esposa casa com um policial. Esse homem
sai da cadeia. Não consegue emprego. É proibido de ver a filha. Volta ao crime.
Recebe uma chance de redenção. Mas isso envolve fazer algo que pode parecer
criminoso. Terá que fazer aquilo que jurou não fazer mais.
Provavelmente todos já viram uma
centena de filmes assim. E isso não seria um problema grave em Homem-Formiga se
a história fosse bem contada. Mas não é. Os estereótipos estão lá e você sabe
exatamente o que vai acontecer na cena seguinte. Os personagens são bem rasos e
geram pouca empatia. As exceções são Hank Pym e Scott Lang que, embora não sejam
criações shakespearianas, possuem um certo carisma.
Então, o filme é uma porcaria?
Nem tanto. A segunda parte do filme, na qual a ação transcorre faz valer a ida
ao cinema. As invasões empreendidas pelo
Homem Formiga são excelentes, as cenas de combate também. Com toda certeza
temos algumas das melhores sequências de ação dos filmes da Marvel.
Algumas pessoas desenvolveram
certa resistência ao filme porque acham os poderes do protagonista... toscos.
Num mundo onde existem Hulk e Thor, que graça tem um cara cuja habilidade é
ficar pequeno? Até as ameaças que ele enfrenta não parecem tão grandiosas
quanto os Chitauri, Ultron ou Loki. Nesse contexto, faz sentido pensar num
paralelo com o filme dos Vingadores: enquanto estes lidam com invasões
alienígenas e cidades jogadas do céu, o Homem-Formiga invade uma fábrica!
Pois bem, aí está uma das ideias
mais interessantes desse longa-metragem: a ideia de que o destino do mundo é
decidido também naquilo que é pequeno. E mais: é nas coisas pequenas que a vida
se realiza. Esse é o motivo pelo qual as relações de família são enfatizadas de
uma maneira que ainda não haviam sido em nenhuma outra produção da Marvel.
Além disso, embora Homem-Formiga
seja um filme menor da Marvel, ele abre grandes possibilidades para o estúdio.
A primeira delas é dada pelo conceito de legado que o filme apresenta: o herói
atual sucede um anterior que possuía os mesmos poderes. Isso faz com que seja
possível trabalhar a relação entre os dois, além, é claro, de ambientar boas
histórias no passado. A segunda vem da apresentação de mais alguns personagens
carismáticos, sendo o principal o próprio Scott Lang. Ele tem tudo para cair nas
graças do público. Por fim, a Marvel passa a ter cada vez mais certeza de que
personagens menores podem ser sustentados em um mundo mais amplo. Homem-Formiga
é de longe o filme com mais relações com o restante do universo cinematográfico
desenvolvido até agora.
Para encerrar, devo dizer que
assistir as aventuras do herói pequenino fez com que eu lembrasse do escritor
inglês G.K. Chesterton que, com frequência, dizia que é melhor ser pequeno que
ser grande, afinal apenas quando nos fazemos menores é que temos a capacidade
de perceber o extraordinário das coisas.
Alessandro Garcia
Doutorando em Sociologia - UFRJ / Fundador da Oficina de Valores
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