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Faz pouco tempo fui convidado a falar em um congresso para jovens. O tema do congresso seria a alegria e eu teria que dar duas palestras. Após muito meditar decidi que daria uma palestra sobre os motivos da tristeza contemporânea, afinal, como diz Chesterton, só nos importamos com a saúde quando estamos doentes; quando estamos saudáveis nos importamos com todas as outras coisas.

A partir da experiência nesse congresso decidi escrever uma sequência de três textos para o blog, não sobre o tema da alegria, mas o que trabalhei em minha primeira colocação em tal evento, a tristeza. O primeiro sairá hoje, o segundo amanhã e o terceiro em seguida. Peço que aqueles que se interessarem acompanhem as três

reflexões porque elas funcionarão como uma única mensagem.

Depois deste pequeno preâmbulo, vamos ao tema.

Reparem que o mundo nunca foi tão brilhante como é hoje. Durante a maior parte da história, a noite foi realmente o domínio das trevas. Hoje nem tanto, ao menos para quem mora nos centros urbanos. As cidades são iluminadas e, mais que isso, chegamos a um ponto, onde, em várias cidades, é possível participar de festas diariamente. Há festas que duram diversos dias consecutivos...

Percebo, no entanto, uma grande diferença dessas festas contemporâneas para a maioria das festas celebradas pelo homem. Elas não comemoram nada. São um fim em si, a festa pela festa. Esse fato poderia nos levar a pensar que a alegria é tão grande que não há mais necessidade de motivos para festejar além da simples razão de estarmos vivos... Quem dera assim fosse!

As baladas não são principalmente ambientes nos quais se expressa a alegria, mas nos quais ela é buscada. Isso é fácil perceber quando convivemos com pessoas que se sentem atormentadas quando não podem sair um sábado à noite. Talvez não precisemos nem observar isso nos outros para constatar a tese que estou defendendo. Talvez nós mesmos sejamos suficientes como exemplo.

Outra grande conquista do mundo contemporâneo foram os analgésicos. A dor física não foi banida de nossas vidas, mas é inegável que ela tem um espaço muito menor do que deve no passado. Convido os leitores a um exercício de imaginação... Pensem em si mesmos sofrendo recebendo o toque de ferro quente em uma ferida... Coloquem-se no lugar daqueles que tinham os dentes arrancados sem anestesia. Até pouco tempo atrás estas eram práticas comuns. E não como tortura, mas como tratamento médico.

Parece, no entanto que os analgésicos, embora muito úteis, só serviram para provar que nossas dores não se resumem ao corpo. Todos os dias pessoas saudáveis caem vítimas de depressão... Todos os dias homens e mulheres de corpo são padecem com o espírito conturbado. Até inventamos alguns “analgésicos” para a psique, mas parece que só eles não resolvem... O problema não é apenas orgânico...

Há também aqueles que se tornam escravos de uma substância que lhes permite esquecer a dor e passam a viver uma vida indigna de homens. Vivem alheios ao mundo e a si, esperando a próxima dose. Muitos falam que as drogas são um problema de saúde pública. Concordo. Mas penso que são mais... São também um problema de existências mal resolvidas.

Apesar de tudo isso, reparo que a tristeza é banida para o quarto dos fundos. Poucas pessoas se admitem tristes. Muitos que dizem “vida loka” afirmam que aproveitam a vida, mas se escondem por trás de uma máscara de falsa alegria. Não digo que não se distraiam e que não tenham picos de euforia, mas não sentem a realização interna que é a base da verdadeira alegria.

Poderia multiplicar os exemplos e argumentos, mas quero apenas afirmar aquilo que já disse no título. O mundo anda triste. E esse não é o maior problema. O maior problema é não admitir isso. O homem moderno tem grandes realizações, mas parece nutrir uma insatisfação grande. E negar uma doença é a melhor forma de ser morto por ela.

Há certo tempo, dei uma palestra sobre a necessidade de angustiar-se. Nessa palestra falei sobre aqueles que não ouvem insatisfações do próprio coração e vivem alheios a si mesmo. Esta estratégia no curto prazo realmente faz com que a tristeza não apareça, mas apenas porque como um câncer ela está criando raízes mais profundas.

Hoje, neste blog, eu convido quem me lê a escutar os apelos do próprio íntimo. Fugimos disso constantemente e, por isso, sentimos com frequência um desconforto que não sabemos de onde vem...

Não pensem que sou masoquista, e que proponho o sofrimento pelo sofrimento. Ao contrário disso. Desejo para mim, e para todos, uma vida realizada, mas sei que ela não se encontra na fuga de si. Acredito que só me aprofundando em minhas reais necessidades e ouvindo a voz dos meus verdadeiros anseios posso identificar os erros no caminho e corrigir o rumo.

Neste texto faço um convite a um exame pessoal, mas não se enganem meus queridos. Não sofremos sozinhos. A tristeza nos dá a falsa sensação que nenhuma dor é como a nossa e faz com que nos isolemos daqueles que padecem da mesma sina. Nossa tristeza é um problema nosso, mas encontra raízes nos rumos do mundo em que vivemos. Sobre estas raízes, falarei amanhã. Hoje encerro com as palavras de Tom Jobim, que em sua canção intuiu a melancolia típica destes dias tristes:

Tristeza não tem fim
Felicidade sim

A felicidade é como a gota
De orvalho numa pétala de flor
Brilha tranquila
Depois de leve oscila
E cai como uma lágrima de amor

A felicidade do pobre parece
A grande ilusão do carnaval
A gente trabalha o ano inteiro
Por um momento de sonho
Pra fazer a fantasia
De rei ou de pirata ou jardineira
e tudo se acabar na quarta feira

Tristeza não tem fim
Felicidade sim

A felicidade é como a pluma
Que o vento vai levando pelo ar
Voa tão leve
Mas tem a vida breve
Precisa que haja vento sem parar

A minha felicidade está sonhando
Nos olhos da minha namorada
É como esta noite
Passando, passando
Em busca da madrugada
Falem baixo, por favor
Prá que ela acorde alegre como o dia
Oferecendo beijos de amor

Tristeza não tem fim
Felicidade sim 
Alessandro Garcia
Mestre em Sociologia - Oficina de Valores

3 comments:

Diego Gonzalez disse...

Reflexão muito boa! Não tinha parado pra pensar nesse ponto de que as festas que seriam pra expressar a alegria é aonde ela é buscada. E parece então que sexta chegarão ao fim 2 triologias, haha.

Anderson Dideco disse...

Mal posso aguardar o 'próximo capitulo'!

Alessandro Garcia disse...

O último capítulo da outra trilogia é só um pouco mais esperado... : )

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