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#AvanteOficina

Por: Alessandro
imagem de: obarrense.wordpress.com
“Não há nada mais prático que uma teoria”. Esta é uma das frases de Chesterton que mais gosto. Gosto porque julgo genial. Julgo genial porque em poucas palavras clarifica muita coisa. As ideias são importantes. E são importantes simplesmente porque sem elas não existe a prática.

Peço que o leitor não desista deste texto depois deste primeiro parágrafo. O assunto que ele vai tratar é de grande valia e eminentemente prático. E é assim justamente por ser teórico. Para deixar mais claro o que quero dizer, vou recorrer a um  exemplo do próprio Chesterton. Exemplo simples e esclarecedor.

“Suponhamos que um homem desejasse determinado tipo de mundo; por exemplo, um mundo azul. Ele não teria razão para se queixar da insignificância ou da rapidez da sua tarefa; poderia dedicar-se por muito tempo a essa transformação, e continuaria trabalhando (em todos os sentidos) até que tudo estivesse azul. Ele poderia ter aventuras heroicas, como dar os últimos retoques de azul em um tigre azul. Poderia ter os sonhos mais fantásticos, como a alvorada de uma lua azul. Mas se ele trabalhasse arduamente, aquele espírito reformador teria, certamente, segundo a sua maneira de ver, deixado o mundo melhor e mais azul do que o encontrara. Se ele pintasse, a cada dia, apenas uma folha de grama com a sua cor favorita, lentamente chegaria ao final. Porém, se a cada dia alterasse a sua cor favorita, nunca conseguiria concluir a tarefa”.

Se as manifestações das últimas semanas nos ensinaram algo é que a grande maioria está insatisfeita. Ou melhor: nós estamos insatisfeitos. Insatisfeitos com o governo, com a situação da educação e da saúde em nosso país, com o transporte público. Todos estes são motivos graves, mas ouso dizer que a insatisfação atual é até mais profunda e atinge aquilo que costumamos chamar de coração. Há uma insatisfação com a sociedade e as estruturas, mas junto com essa, caminha uma insatisfação existencial, uma insatisfação com a própria vida.

O reconhecimento e a expressão desta inquietação é positivo. Dificilmente muda quem não admite que não está satisfeito. A questão é: tão importante quanto saber que está insatisfeito, é saber a causa de tal insatisfação. Experimentar a sensação de que as coisas não estão bem, mas não saber qual a raiz desse mal, ou o que fazer para arrancá-la, é uma situação desesperadora.

Mas o que isso tem a ver com alguém que quer pintar o mundo de azul? Simples. No exemplo de Chesterton existe um homem que acredita que o mundo está pior do que deveria e que ele pode fazer algo para mudar essa situação. Esse homem tem ideias claras sobre o que acredita. Acredita que o mundo precisa ser azul e que vale a pena se esforçar para que ele assim seja. Ter uma visão sobre o mundo é fundamental para atuar nele.

Creio não ser incomum encontrar pessoas que criticam a tudo e a todos (exceto a si próprias). Admito que tenho desconfiança de pessoas assim. Não que eu esteja conformado e ache que tudo anda as mil maravilhas comigo e com o mundo. Muito pelo contrário. Acontece que por diversas vezes encontro, no mesmo discurso, críticas contraditórias. Percebo então que tais posicionamentos são tomados ao sabor do momento e são movidos por interesses ou por opiniões em moda. Friso que não me refiro apenas às grandes questões políticas, mas às situações cotidianas como conflitos de opiniões e administração de relacionamentos.

Quem não possui ideias claras corre o risco de simplesmente seguir a maioria ou quem fala mais alto e mais bonito. Não que a maioria esteja sempre errada ou que um discurso belo seja por definição hipócrita, mas qualquer adesão não refletida é por definição menos livre.

Claro que não vamos ficar pensando “ad infinitum”, é preciso tomar decisões. Digo apenas que nenhuma prática está desprovida de ideias e que conhecê-las é importante não apenas para atuar melhor, mas também para saber se estamos caminhando para onde desejamos ir. Triste seria pintarmos um mundo inteiro de azul apenas para descobrir que o preferíamos amarelo. 

Um conceito que pode nos ser útil para pensar nestes momentos é o de ideologia. Esta palavra é daquelas que tem um milhão e meio de significados. Por isso, para usá-la é preciso defini-la bem. Embora eu não tenha nada de marxista, vou utilizar esta palavra num sentido próximo aquele utilizado por Karl Marx. Segundo tal pensador, ideologia, entre outras coisas, é uma falsa consciência; um conjunto de ideias que nos impede de ver a realidade. Uma ideologia faz com que as ideias sejam descoladas dos fatos e que os fatos sejam ignorados em nome das ideias.

Ideias boas são aquelas que nos abrem para o mundo, que nos fazem vê-lo e interpretá-lo de maneira mais clara. Só quando conhecemos bem a realidade que nos cerca, podemos ser mais livres em nossas opções, mais justos em nossas posições, mais eficazes em nossas atitudes.

Por que as ideologias nos cegam da realidade? Acho que uma resposta boa é aquela que segue a linha chestertoniana: uma ideologia nos cega porque ela é uma verdade que enlouqueceu. Uma verdade enlouquece quando deixa de lado todo o restante da realidade e se afirma como único ponto importante. Vamos a um exemplo: é uma verdade que todos os iguais têm igual dignidade e a promoção da igualdade tende a ser uma coisa boa. Acredito que ninguém vá dizer que a desigualdade social seja algo positivo. No entanto, quando a igualdade se torna um princípio único, ela fica louca. De maneira mais concreta: uma sociedade onde todos são iguais, mas a liberdade não é valorizada, é uma definição perfeita de ditatura ou tirania. 

O mundo é complexo e uma boa visão deste mundo é aquela que nos abre para todos os aspectos da realidade. Claro que podemos ter ênfases e devemos começar a pensar por algum ponto; no entanto, quando nos deixamos enfeitiçar por uma ideia a ponto de jogarmos a realidade para debaixo do debate, isso significa que alguma coisa vai mal. O exemplo de Chesterton utilizado acima, embora tenha sido feito para outra coisa, é útil para pensar tal situação. O homem mencionado tinha um projeto bem concreto. Mas esse projeto era ruim porque tornava o mundo mais pobre do que é. Em sua ânsia por corrigir os defeitos do mundo, o homem estava acabando com suas qualidades. Um mundo de uma só cor talvez tenha suas qualidades, mas com certeza será monótono e entediante.

Diante de tudo isso cabe perguntar: em que eu acredito de verdade? Talvez para muitos a resposta seja um grande “não sei direito”. Se esse for seu caso, cabe abrir os olhos para o mundo e interessar-se mais pelos dramas a maravilhas a nossa volta. Se, ao contrário, você possuir uma resposta, penso que também cabe abrir os olhos para o mundo e perguntar se tal resposta abre-se à realidade e corresponde às exigências do coração.

Se a resposta final for um grande sim, mãos a obra. Que a reforma comece. Que as tintas de diversas cores caiam sobre o mundo. Contudo, é importante não se esquecer de começar a pintura em si mesmo. Afinal, não é digno de confiança quem diz que o mundo carece de certas cores e não pinta a si primeiro.

Alessandro Garcia
Doutorando em Sociologia / Fundador da Oficina de Valores

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