Por: Alessandro Garcia
Não é pequeno o incômodo gerado pela fofoca. Se algum dia eu fizer uma lista das coisas acerca das quais se fazem mais reclamações, acredito que a fofoca esteja entre os dez primeiros colocados. Frases como “não param de cuidar da minha vida" são comuns tanto em rodas de conversa quanto nas redes sociais.
Faz certo tempo que aprendi a desconfiar das pessoas que veem fofoqueiros e fofocas em toda a parte. Sem querer ser freudiano, em vários destes casos percebo uma projeção: os
mordazes críticos acabam por odiar no outro o defeito que está em si.
De qualquer maneira, hoje não vim aqui denunciar os vícios e as contradições dos fofoqueiros. Vim elogiá-los. Podem acreditar. É a mais pura verdade. Ou ao menos parte dela. Quero gastar alguns minutos do meu tempo escrevendo sobre os aspectos positivos existentes no ato de fofocar. E podem acreditar que eles não são poucos.
Por mais paradoxal que possa parecer, normalmente os males são apenas corrupções do bem. O poder de sedução dos vícios está no núcleo de “bondade” que neles reside. Este bem pode ser corrompido quando buscado em detrimento de outros maiores, mas ainda assim mantém sua qualidade de ser bom. Ninguém busca o mal por si.
Deixando de lado essa filosofada vamos ao assunto: o que a fofoca tem de bom? Para começar minha breve explanação quero citar uma afirmação bastante difundida e que vi pela primeira vez no mural de um curso de inglês:
“Grandes pessoas discutem sobre ideias, pessoas medíocres falam sobre coisas e já pequenas pessoas falam sobre outras pessoas.”
Tal frase parece conter grande verdade e ser uma crítica definitiva aos portadores da fofoca. Aceito que há algo de verdade e que é horrível tecer uma conversa com alguém que não sabe falar de nada além da vida alheia. No entanto, julgo que um mundo que vivesse ao pé da letra tal afirmação, seria um mundo frio e triste. Afinal, se a frase está correta mães que falam sobre seus filhos, colegas que contam as aventuras de seus companheiros e filhos que narram “causos” de seus pais são todos pessoas pequenas.
O que os fofoqueiros descobriram e que o autor da frase acima (seja ele quem for) talvez precise aprender é que pessoas são mais interessantes que qualquer outra coisa. Qualquer ideia, por mais interessante e importante que seja, está sob controle. É possível defende-la mesmo que não seja verdadeira. Falar mal dela, mesmo que esteja correta. Divulgá-la, mesmo sendo inútil. Retê-la, mesmo sendo essencial. As ideias são em si mesmas passivas (talvez seja por isso que Platão apontou o mundo das ideias como imutável). Em suma: ideias não reagem, mas suportam estoicamente o que quer que alguém faça com elas. São destruídas sem ao menos soltar um grito de súplica. Algo muito parecido, embora com nuances, pode ser dito sobre as coisas.
As pessoas, por outro lado, não são assim. Elas podem revidar, resistir e ajudar. E para além disso tudo, podem mudar e nos surpreender. Buscar entender uma pessoa é uma aventura inesgotável que sempre trará novidades. Para quem duvida disso recomendo que converse com pais de crianças pequenas; para eles o menor dos passos do filho gera mais vibração que o maior clássico da literatura. E julgo não ser equivocado dizer que eles estão corretos em sua atitude.
Outra tese que os fofoqueiros, quando ampliam um fato ao repassá-lo, afirmam de forma inconsciente é que todo gesto humano, mesmo que pareça pequeno, é muito maior do que se pode imaginar. A festa e o drama da humanidade decorrem da impossibilidade de termos atos pequenos. Pisar um chão lamacento, tirar um cochilo à tarde, rir de uma piada, chorar por um amor impossível: nenhum destes atos se restringe à terra e todos eles carregam o selo da eternidade.
Talvez neste ponto, alguns leitores possam objetar: “Alessandro, tudo isso é muito bonito, mas os fofoqueiros normalmente falam mal das pessoas e não comunicam todo esse extraordinário que você fala aí”.
Faz certo tempo que aprendi a desconfiar das pessoas que veem fofoqueiros e fofocas em toda a parte. Sem querer ser freudiano, em vários destes casos percebo uma projeção: os
mordazes críticos acabam por odiar no outro o defeito que está em si.
De qualquer maneira, hoje não vim aqui denunciar os vícios e as contradições dos fofoqueiros. Vim elogiá-los. Podem acreditar. É a mais pura verdade. Ou ao menos parte dela. Quero gastar alguns minutos do meu tempo escrevendo sobre os aspectos positivos existentes no ato de fofocar. E podem acreditar que eles não são poucos.
Por mais paradoxal que possa parecer, normalmente os males são apenas corrupções do bem. O poder de sedução dos vícios está no núcleo de “bondade” que neles reside. Este bem pode ser corrompido quando buscado em detrimento de outros maiores, mas ainda assim mantém sua qualidade de ser bom. Ninguém busca o mal por si.
Deixando de lado essa filosofada vamos ao assunto: o que a fofoca tem de bom? Para começar minha breve explanação quero citar uma afirmação bastante difundida e que vi pela primeira vez no mural de um curso de inglês:
“Grandes pessoas discutem sobre ideias, pessoas medíocres falam sobre coisas e já pequenas pessoas falam sobre outras pessoas.”
Tal frase parece conter grande verdade e ser uma crítica definitiva aos portadores da fofoca. Aceito que há algo de verdade e que é horrível tecer uma conversa com alguém que não sabe falar de nada além da vida alheia. No entanto, julgo que um mundo que vivesse ao pé da letra tal afirmação, seria um mundo frio e triste. Afinal, se a frase está correta mães que falam sobre seus filhos, colegas que contam as aventuras de seus companheiros e filhos que narram “causos” de seus pais são todos pessoas pequenas.
O que os fofoqueiros descobriram e que o autor da frase acima (seja ele quem for) talvez precise aprender é que pessoas são mais interessantes que qualquer outra coisa. Qualquer ideia, por mais interessante e importante que seja, está sob controle. É possível defende-la mesmo que não seja verdadeira. Falar mal dela, mesmo que esteja correta. Divulgá-la, mesmo sendo inútil. Retê-la, mesmo sendo essencial. As ideias são em si mesmas passivas (talvez seja por isso que Platão apontou o mundo das ideias como imutável). Em suma: ideias não reagem, mas suportam estoicamente o que quer que alguém faça com elas. São destruídas sem ao menos soltar um grito de súplica. Algo muito parecido, embora com nuances, pode ser dito sobre as coisas.
As pessoas, por outro lado, não são assim. Elas podem revidar, resistir e ajudar. E para além disso tudo, podem mudar e nos surpreender. Buscar entender uma pessoa é uma aventura inesgotável que sempre trará novidades. Para quem duvida disso recomendo que converse com pais de crianças pequenas; para eles o menor dos passos do filho gera mais vibração que o maior clássico da literatura. E julgo não ser equivocado dizer que eles estão corretos em sua atitude.
Outra tese que os fofoqueiros, quando ampliam um fato ao repassá-lo, afirmam de forma inconsciente é que todo gesto humano, mesmo que pareça pequeno, é muito maior do que se pode imaginar. A festa e o drama da humanidade decorrem da impossibilidade de termos atos pequenos. Pisar um chão lamacento, tirar um cochilo à tarde, rir de uma piada, chorar por um amor impossível: nenhum destes atos se restringe à terra e todos eles carregam o selo da eternidade.
Talvez neste ponto, alguns leitores possam objetar: “Alessandro, tudo isso é muito bonito, mas os fofoqueiros normalmente falam mal das pessoas e não comunicam todo esse extraordinário que você fala aí”.
Sobre tal crítica tenho apenas uma discordância. Os fofoqueiros não falam mal de ninguém. Muito pelo contrário, falam bem até demais. Ou ao menos falam de uma forma que traduz o interesse pelo assunto. Se falassem mal ninguém os ouviria e as fofocas morreriam logo que saíssem de suas bocas.
Deixando de lado esse pequeno detalhe, cabe dizer que os fatos estão a favor daqueles que dizem que os fofoqueiros tem uma predileção por falar mais sobre o mal que sobre o bem. Aqui, percebo outra grande intuição destes arautos das notícias sobre a vida alheia. O mal é algo estranho e por mais que ocorra com freqüência parece fugir da normalidade. Quando alguém diz com grande interesse que alguém praticou o mal, parece pressupor que isso espanta. Em sua atitude, por diversas vezes pouco caridosas, o fofoqueiro parece tocar o mistério do pecado original.
Há ainda aqueles que dizem que o fofoqueiro não é confiável. E eles têm razão. Não é confiável não porque o assunto de que trata não seja importante ou porque a vida alheia nunca deva ser um assunto, mas porque ele é um fanático e todo fanático distorce aquilo que afirma. Li em algum lugar que “fanático é alguém que não consegue e não quer mudar de assunto”. Falam quando não deveriam e sobre o que não deveriam.
O problema do fofoqueiro não é se interessar pelas vidas daqueles à sua volta; o problema é que por mais que seu interesse pareça grande ele é de fato muito pequeno. Se seu interesse fosse maior, o outro seria mais que um assunto. O fofoqueiro gosta tanto das pessoas que deixa de amá-las. Importam-se tanto com os dramas de seus erros que fecham os olhos para as comemorações de seus acertos
Mesmo assim, julgo que no mundo atual, onde cada um tende a cada vez mais viver em um isolamento egoísta e a cultura da tolerância tende a substituir à cultura da solidariedade, temos muito o que aprender com aqueles que adoram fofocar. Seu interesse, como já disse, pode ser pequeno e estreito, mas é genuíno. O fofoqueiro ainda se empolga com o outro. Um homem que deixe de falar sobre pessoas pode até ser um intelectual erudito com muita coisa interessante na cabeça, mas, por fim, será frio e com pouca coisa bela no coração.
É, parece que os fofoqueiros, mesmo tão cheios de erros e tão odiados, chamam a atenção para algo essencial: a centralidade da pessoa. A fofoca acaba por ser, no fim das contas, a afirmação de que homens, mulheres e crianças com suas peripécias constituem um universo rico de significado e vibração. Que possamos nunca esquecer que um mundo onde as coisas e as idéias importam mais que as pessoas, é, no fim das contas, um mundo desumano.
Alessandro Garcia
Doutorando em Sociologia - Coordenador da Oficina de Valores
1 comments:
Texto muito legal. Mas não posso deixar de comentar que o que mais gostei foi do "Doutorando em Sociologia" =)
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