Foto: AFP
Depois de perder feio, depois de um 7 a 1
Ontem completou-se um ano dos
inesquecíveis 7 a 1. Os meios de comunicação, especialmente a internet,
encheram-se de notícias, piadas, análises, “comemorações” da data “especial”.
Nós estamos postando um dia depois da “festa”, um atraso, em parte, intencional.
Lembro-me de ter escrito há exato um ano (sim, um dia depois do jogo) um texto
intitulado “palavras do dia seguinte”. Esse texto não foi publicado aqui ou em
lugar algum porque não consegui terminar: para fazer jus ao título, faltaram-me
só as palavras. Um ano depois, já consigo reunir palavras para falar da
derrota, mas já não interessam tanto. Vale mais, talvez, falar do que se lhe
seguiu.
A verdade é que o tempo futuro é
um universo de possibilidades, e o tempo que se seguiu depois do “Minerazzo”,
como chamaram as manchetes, (ou “Mineratzen, que achei mais inteligente) podia ser
de redenção ou perda total. Por exemplo, Neymar podia ter-se abalado com a
derrota, e com as circunstâncias dela, mas destacou-se no Barcelona, ganhou
artilharia, formou um trio já histórico com Messi e Suárez (que também saiu
feio da Copa). David Luiz podia ter dado a volta por cima, conquistado títulos,
voltado a se destacar; em vez disso, não estivesse eu digitando esse texto, ele
poderia me emprestar uma ou duas canetas para eu escrevê-lo. Se você não entendeu
a piada, digamos só que... ele não vem jogando bem. Bom, são apenas exemplos, e
peguei os extremos. Mas em situações semelhantes de um ou outro estão os outros
jogadores que estavam lá, naquele dia, naquele inglório dia.
Mais do que cada jogador em
particular, cabe falar do que poderia se dar (e do que se deu) do futebol
brasileiro, como um todo, e da Seleção. Poderíamos ter-nos surpreendido com a
escolha do novo treinador; em vez disso, o Dunga reassumiu (não que não tenha
sido uma surpresa, mas surpresas podem ser boas ou...). Poderíamos, há poucos
dias, ter comemorado um título de Copa América, um passo na volta por cima a
ser dada; em vez de título, eliminação ridícula (pelo menos aqui, ninguém pode
reclamar de surpresa desagradável: não foi surpresa). Poderíamos ver um time
reformulado, com um plano de jogo, mas temos nas últimas convocações, ou figurinhas
repetidas, ou novidades que são 7 por meia quinzena (perdoem-me o equívoco
matemático, foi só para encaixar um 7) e nosso jogo ainda é “bola no Neymar”,
essa maldita dependência que é técnica, mas também psicológica.
Lembro que publicamos um texto
aqui que falava da volta por cima da Alemanha, depois de perder para nós em
2002. Investimento, reinvenção, aprendizado com a forma de jogar do vencedor.
Nós, não! Continuamos acreditando
que éramos os melhores, tratamos a derrota como coisa pontual, um apagão,
atribuímos até a um transcendental fantasma da “copa em casa”. Os dirigentes do
nosso futebol demoraram um ano para se tocar: “ei, talvez haja uma causa estrutural
para essas derrotas”. Já é um passo, falta eles enxergarem que a causa do
problema talvez esteja escondida no bolso ou na carteira deles (ai, ai, ainda
seremos processados, eu e minha boca grande).
Tudo isso citado, nos últimos
parágrafos vou deixar o futebolístico de lado para trazer o existencial: o
problema não é perder, mesmo que perder feio; o problema é o que você faz
depois da derrota.
O arrogante, quando perde,
atribui ao mau tempo, à desonestidade do adversário ou do juiz, à má sorte. O
humilde reconhece falhas, aprende com quem fez certo, se corrige. O fraco “desce
a ladeira”, o corajoso esforça-se o dobro para compensar a perda. E como “futebol
é coletivo”, como se diz popularmente, digo: aos unidos, a derrota une mais;
aos divididos, a derrota corrói qualquer resto de laços que haja. Tudo é uma
questão de como se encara a derrota, de que reflexões, se alguma, a perda nos
causa.
O mestre da crônica, Nelson
Rodrigues, dizia que o brasileiro era um "Narciso às avessas" que "cospe na própria imagem". Hoje me parece que, depois de muitos títulos e glórias, somos um Narciso, Narciso mesmo. Mas um Narciso caduco, olhando não um reflexo, mas uma foto antiga, recusando a aceitar que o tempo passou, enganando-se com uma beleza que já se foi.
Nelson Rodrigues também diz, com um quê de fantasia, que o Maracanã, ao fim do jogo final da
Copa de 50, era um completo silêncio: 200.000 brasileiros juntos num estádio, e
faziam silêncio. Depois daquilo, o futebol brasileiro, que já era o melhor, só
não tinha título de Copa, se reinventou, reuniu craques e fez surgir o maior
deles. Oito anos depois, era campeão do Mundo.
Depois da tragédia nacional dos 7
a 1 (que custo chamar assim quando penso nas verdadeiras tragédias da nossa
nação), chorou-se, esbravejou-se, reclamou-se, fez-se um tudo, menos...
silêncio. E por silêncio, entenda-se reflexão. E falando em reflexão, entenda-se
de uma vez: as perdas que não provocam reflexão tornam-se traumas ou tragédias;
mas ao contrário, quando nos pomos a pensar nas derrotas é que aprendemos a
vencer.
Gustavo Cardoso Lima
Estudante de Jornalismo / Oficina de Valores
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