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#AvanteOficina

01:20
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Por: Alessandro

Imagem: globo.com.

Em certos aspectos, este texto está atrasado. O acontecimento que o motivou há muito tempo não é discutido nas redes sociais e nem aparece nos jornais. Gostaria de tê-lo escrito antes, mas por pura falta de tempo não consegui. Talvez seja melhor assim. Escrevendo agora, trago, ao menos para um pequeno grupo, o assunto de volta à pauta. Além disso, passado o turbilhão, talvez o tema possa ser discutido com mais calma.

Embora creia que o título revele o que quero discutir, não custa fazer uma pequena retrospectiva. Há poucos meses atrás, um rapaz foi agredido e preso a um poste no bairro do Flamengo por um grupo de pessoas que se designaram como “justiceiros”. O jovem já era conhecido por realizar assaltos na localidade. Algumas pessoas chegaram a falar até em estupros cometidos por ele.

O assunto polarizou opiniões. De um lado estavam aqueles que defendiam os justiceiros, afirmando que eles prestavam um serviço à comunidade, que já se sentia acuada por tantos assaltos. Do outro, colocaram-se aqueles que julgam que a justiça cabe ao Estado e o que foi feito com o rapaz foi uma grave violação dos direitos humanos.

Durante toda esta polêmica, ao sair do trabalho e andar por Botafogo, testemunhei uma moça ser assaltada por um rapaz bem parecido com aquele que foi acorrentado no poste. Vi a reação das pessoas, a revolta por ver aquela jovem jogada no chão. A tentativa de pegar o rapaz e resgatar os objetos roubados. Passados alguns instantes ouvi pessoas dizendo o seguinte: “Quando alguém pega, dá uma coça e amarra no poste, logo vem o pessoal defender”. Dias atrás também escutei a seguinte frase de uma senhora bem simpática: “Tem muito vagabundo no mundo. Eu não tenho pena de vagabundo”.

Antes de continuar meu argumento quero dizer que não vilanizo quem pensa assim. Entendo bem a gênese de tal postura. A sensação de medo e insegurança, o fato de já ter sofrido algum tipo de violência e o descrédito para com as instituições de segurança pública fazem com que as pessoas julguem que violência se combate com violência, que “bandido bom é bandido morto” e que “direitos humanos são para humanos direitos”.

Não vilanizo as pessoas, mas tenho muito medo dessas ideias. Medo porque sei que as ideias são forças sociais. O fato de que é possível compreender a situação que dá origem a certos pensamentos não torna tais teses justificáveis, apenas faz com que tenhamos uma noção de que o problema é mais profundo. Penso que justamente por isso é importante parar e pensar com calma, afinal o medo e o ódio não costumam ser bons conselheiros.

A meu ver aqueles que defendem a ação dos justiceiros e outras atitudes de cunho mais violento cometem um grande equívoco: olham apenas o perpetrador da violência e esquecem as causas invisíveis da mesma. Falar da grande desigualdade social, da violência cotidiana sofrida por milhares de menores em nosso país, da falta de acesso a educação de qualidade, é praticamente chover no molhado. É claro que quem é assaltado dificilmente vai lembrar-se disso no momento em que sofre o assalto, mas é importante, na reflexão dos dias comuns, lembrar que há uma triste estrutura por trás da criminalidade.

Antes que me acusem, não estou negando a responsabilidade de quem comete crimes, nem dizendo que o ser humano não é livre em suas escolhas. Acredito na liberdade humana, mas não esqueço que existem também condicionamentos. Fico sempre com a forma do filósofo espanhol Ortega: “eu sou eu e minhas circunstâncias”. Até onde vai a liberdade? Quando começam os condicionamentos? Não sei. Creio que ninguém sabe. Só sei que não podemos deixar de lado nenhum dos dois lados da moeda quando pensamos em segurança pública.


Outro erro comum é aquele que reduz uma pessoa ao seu crime. Quando alguém diz que “bandido bom é bandido morto” ou que “não tem pena de vagabundo” está se esquecendo de que esse bandido tem um nome e que o vagabundo tem história. Além de bandido, ele é também filho, irmão, amigo... enfim, é pessoa. Pessoa que pode ter cometido grandes e terríveis erros, mas que não se resume a eles.


Chegando a esse ponto, já imagino certas colocações do tipo: “Mas e os direitos da vítima? Eles não foram respeitados pelo bandido”. Certamente que não! Se tivessem sido respeitados não haveria motivo para essa discussão. Assaltos, assassinatos, sequestros e estupros são crimes graves. Quem os comete deve ser punido. Essa punição, no entanto, não pode se resumir a uma vingança, mas realizar a justiça. E esta última, além do elemento punitivo, tem também uma dimensão de “resgate”.


Para desenvolver este ponto, faço menção a um aspecto da justiça tal como pensada por Paulo de Tarso. Em sua carta aos Romanos, o famoso apóstolo faz menção a uma “justiça justificadora”, ou seja, a um ato que pretende não apenas punir, mas transformar aquele que é injusto. Uma postura que discorda dos justiceiros e de posturas desrespeitosas aos direitos humanos pode ser entendida em linha de continuidade com essa noção cristã.

O grande ponto que é difícil de entender em relação aos direitos humanos é que estes são inalienáveis. Isso significa que nada que alguém fizer pode anulá-los e que nem mesmo o indivíduo pode abrir mão deles. Eles são o mínimo que alguém deve receber simplesmente por ser humano. É justamente esse mínimo que torna possível qualquer ação de reabilitação. 

Além dessa dimensão, cabe dizer que os direitos humanos são garantias para a sociedade como um todo. Não são apenas para “proteger bandidos” como dizem por aí. É a partir de tais direitos que pensamos os limites do Estado e as ações da sociedade. Tais direitos quando aplicados garantem, por exemplo, que inocentes acusados injustamente não sejam tratados de maneira bárbara. 

O que separa um cidadão comum de um criminoso? Penso que a grande diferença é que o primeiro respeita direitos que o segundo deixou de respeitar. Nessa perspectiva, os direitos humanos não são apenas para “humanos direitos”. Quando entenderem isso, os próprios “humanos direitos” desejarão que os direitos humanos sejam para todos.

A mera reação violenta, seja por parte do Estado, seja por milícias ou grupos semi-organizados, não dá conta do problema da violência. Prender no poste não resolve. E o fato de que o rapaz que sofreu essa agressão já foi visto de volta às velhas práticas é uma prova disso. É claro que é necessária uma estrutura de segurança pública e o uso da força em algumas situações é legítimo. Isso, contudo, não torna a reação violenta um remédio por si mesmo. Uma ação, seja por parte do indivíduo, da sociedade ou do Estado, que leve em conta a dignidade inalienável da pessoa humana não é apenas o melhor caminho, mas o único que pode promover uma integral e verdadeira justiça.

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