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#AvanteOficina

23:37
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Por: Thales





O frio que fazia naquela noite era anormal para o inverno da Judeia. Os animais estavam estranhamente inquietos, e parecia que não era só o frio que os incomodava. A brisa gélida cortava o rosto de Roi, mas ele mal se dava conta disso. Ele seguia com dificuldade pelo Vale de Elah, pois era uma noite sem lua e a escuridão parecia mais espessa do que de costume. Os arbustos, em grande parte já secos e sem folhas; a longa colina dos montes que cercavam o vale, que em outras épocas do ano era verdejante e cheia de vida, e hoje revelava um chão cinzento e pedregoso; o céu, cor de ébano, denunciando que as nuvens que cobriam o dia, também cobriam a noite. Tudo isto celebrava um silêncio solene, estranho. Um silêncio tal qual o silêncio numa conversa com alguém com quem não se sabe mais o que falar. Um silêncio que incomodava, constrangia.

“Você tem certeza do que ouviu, Roi?”

O tom de voz de Asher denunciava que também ele sentia este constrangimento. Mas nós somos irmãos... Só se sente este tipo de coisa com estranhos... Não era em relação um ao outro que eles sentiam isso, Roi estava certo.

“Perguntar isso dez vezes não vai me fazer mudar minha resposta, Asher!”, retrucou Roi, em sussurro. “Já te disse que ouvi o que ouvi!”

Na cidade de Davi, nasceu o salvador. Essas eram as palavras que não paravam de ecoar no interior de Roi. Eram as palavras que Roi tinha escutado daquela senhora. Ou seria um garoto? Enquanto seu irmão tinha ido levar as ovelhas para o pasto, alguém tinha lhe falado, com voz suave. Suave? Não tinha sido uma voz forte? Esta pessoa, porém, lhe tinha aparecido umas poucas horas antes, quando já estava escuro. Não importa o quanto tentava, ele não conseguia lembrar com precisão como ela tinha chegado até onde ele estava, sozinho, sentado com as costas na única árvore de toda a planície. Não lembrava se ela teria chegado a cavalo. Ou talvez tivesse chegado silenciosamente caminhando. Ou desceu do céu. Desceu do céu? Sim, a única coisa que Roi tinha certeza era que se tratava de um anjo de Deus. Na cidade de Davi, nasceu o salvador. Roi sabia que o anjo tinha falado outras coisas, mas não conseguia se lembrar o que era.

Roi não sabia muito bem como os anjos eram. Por um momento, sua mente transportou-se para sua infância, não tão distante, e ele se lembrou de sua avó, com seu rosto largo, mas gentil. Pele enrugada, mas macia como pluma. Ele se lembrava de quando ela lhe contava histórias de profetas e baleias, de homens com a força para derrubar torres, histórias de anjos que guiavam um homem até sua amada. E a história do rei Davi... Ele lembrava de modo muito particular naquela noite, da história de como o pastor Davi, em sua juventude, tinha sido escolhido por Deus para reinar. De como ele tinha vencido o gigante com apenas um pedaço de pano e uma pedra. De como, sobre ele, tinha sido invocada a profecia do salvador. Era sobre a descendência de Davi que a promessa seria cumprida. Ele seria o pai do salvador. O messias nasceria da casa do rei Davi. Na cidade de Davi, nasceu o salvador.

“Roi? Roi?” Ao perceber subitamente o olhar assustado de seu irmão, Roi se deu conta de que tinha se perdido em devaneios. “Estamos perto, Roi. Aqui estão as primeiras casas”. Asher, com seu aspecto esguio e alto, com o cabelo todo enrolado em pequenos cachos cor de mel, conservava seu habitual tom sarcástico, porém sem poder esconder totalmente a apreensão. “E agora, Roi? Onde está esse seu salvador? Acho que vai ter que perguntar ao anjo de novo...”

“Não é brincadeira, Asher”. Roi franzia suas fartas sobrancelhas. O garoto, cinco anos mais novo que seu irmão, era mais baixo. Seu cabelo era também mais maciço e mais escuro, de forma que o turbante em sua cabeça era como uma ilha num mar castanho. “O anjo anunciou que a profecia se cumpriu!”

“Há! Profecia?! Nossa família há anos passa fome: você mesmo já viu morrer dois de nossos irmãos!” Asher continuava com sua ironia, mas agora a raiva e a revolta já margeavam suas palavras. “E nosso pai, que morreu nas mãos de um soldado corrupto desse César? E nosso povo, que vive servindo aos romanos?” Ele cuspiu no chão, como se a simples menção a César Augusto e a Roma já tivesse sujado a sua boca.

Roi procurava ferozmente uma forma de responder à provocação de Asher, mas as palavras do seu irmão foram suficientes para que ele se lembrasse do sofrimento que sua família e seu povo tinham sofrido desde que aquela promessa tinha sido feita ao rei Davi. Será que é mesmo verdade? Será que eu não estou ficando louco?

Roi se lembrava também das vezes que ele mesmo tinha se sentido sozinho. Das vezes em que o seu Deus parecia que o tinha abandonado. Sua avó tinha lhe ensinado a confiar sempre no Senhor, a amá-lo acima de todas as coisas. Mas tem tanta coisa que me faz desanimar... Roi olhava para baixo enquanto continuava lentamente o caminho. Tanta coisa que me faz duvidar do Senhor... O jovem pastor já sentia a água se acumular nos seus olhos. Será que ele realmente me ama? Será que ele ainda se lembra da promessa? As primeiras lágrimas rolavam e aqueciam a pele seca e fria do seu rosto. Será que ele existe?

Na cidade de Davi, nasceu o salvador.

“Roi! Olhe!” Asher apontava para o céu e parecia assustado com algo.

Enxugando o rosto, Roi levantou a cabeça para ver o que era, e viu um ponto brilhante no céu. Um globo brilhante parecia pairar sobre as nuvens, como se uma estrela tivesse descido e decidido ficar mais perto da terra. O coração de Roi pulsava rapidamente, e agora ele só ouvia, mais forte do que nunca, a voz do anjo em sua mente. Na cidade de Davi, nasceu o salvador...

Ele olhou em volta e viu que um raio de luz saia da estrela e pousava em direção a uma pequena casinha. A escuridão, antes espessa, dissipava-se cada vez mais, como se estivesse cedendo lugar à luz que emanava da estrela.

“Ali, Asher!” E Roi começou a correr em direção à casa. Asher imediatamente o seguiu, falando algo que Roi não conseguia discernir.

Conforme se aproximava, Roi se dava conta do cenário à sua volta. Eles não estavam mais sós. Havia ali outras pessoas, outros pastores da redondeza. Havia animais: burros, ovelhas e bois. Havia até três camelos próximos à casa. Todos pareciam ajoelhados em reverência. Todos os olhos brilhavam com a luz que refletia da estrela. Mas a luz não vem da estrela. E, ao finalmente adentrar a casa, Roi parou e pôde contemplar aquela cena. De fato, algo grandioso acontecia ali.

E o pequeno pastor, naquele momento, lembrou-se das palavras do anjo. Ele jamais as esqueceria novamente. Não existe mais tristeza.  Ele contaria sua história muitas vezes, a seus amigos e vizinhos, a seus filhos e netos. Não existe mais dor. Foram as palavras mais importantes que ele jamais ouviu nesta terra. Deus está aqui. Foram o anúncio de uma nova e definitiva era.
Não temas!
Eis que trago uma grande notícia, que será alegria para todo o povo.
Hoje, na cidade de Davi, nasceu o salvador, que é o Messias, o Senhor.
Acharás um menino, recém-nascido, envolto em faixas e posto em uma manjedoura.
E isto te servirá de sinal.

E os anjos cantaram.


Thales Bittencourt
Oficina de Valores

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